Quando percebeu que a relação com os seus filhos se baseava em “lutas de poderes constantes”, em “faltas de respeito” e que andavam num “permanente braço de ferro”, Nuno Pinto Martins decidiu que algo tinha que mudar. Depois de muitas pesquisas, encontrou a Disciplina Positiva, que veio virar do avesso o dia a dia lá de casa. Tornou-se num pai mais confiante e os seus filhos em crianças mais felizes.
No lugar do braço de ferro, passou a haver espaço para uma relação saudável, assente na firmeza e no carinho, pilares que acredita serem essenciais na educação. Nuno Pinto Martins, fundador da Academia e do blogue Educar pela Positiva, lançou recentemente o livro “Educar pela Positiva: um guia para pais e educadores”, onde dá dicas poderosas e conta episódios reais, da sua experiência enquanto pai, que podem ajudar os educadores a melhorarem a relação com as crianças e os adolescentes.
O Abecedário da Educação esteve à conversa com Nuno Pinto Martins, para lhe dar a conhecer um bocadinho daquilo que poderá encontrar neste livro, uma autêntica lufada de ar fresco para quem procura respostas para as perguntas que surgem constantemente neste grande desafio que é educar.
O Nuno diz-nos, no Prólogo do seu livro, que a Disciplina Positiva surgiu numa altura em que se sentia por vezes incapaz de impor a ordem, de estabelecer limites e rotinas com os seus dois filhos. Como muitos pais, o Nuno questionou o seu comportamento enquanto pai e se este seria o melhor para os seus filhos. Esta nova abordagem à educação tornou-o num pai mais confiante?
Sem dúvida! Mas mais confiante não quer dizer perfeito. Continuo a ter dúvidas, a errar certamente neste caminho tão difícil como emocionante de educar. Com o conjunto de estratégias e “ferramentas” que a Disciplina Positiva trouxe, consigo responder de uma forma mais eficaz aos comportamentos e necessidades dos meus filhos e construir com eles uma verdadeira equipa.
Relativamente aos seus filhos, em que aspetos conseguiu observar neles melhorias no que diz respeito ao comportamento e recetividade à aprendizagem?
O processo foi gradual, pois não existem varinhas mágicas na educação. Mas aos poucos fui notando diferenças ao nível da autonomia, responsabilidade, cooperação e autoestima. Fui-lhes ensinando formas de autocontrolo e a refletirem sobre os seus comportamentos, sobre o mundo à sua volta e sobre si próprios, sobre o que pensam e sentem. Tornaram-se crianças mais confiantes e, acredito, mais felizes.
Consegue prever quais poderiam ter sido as consequências negativas para si e para os seus filhos no caso de não ter tomado a atitude de procurar outras abordagens educativas?
As consequências já estavam à vista antes de procurar a abordagem da Disciplina Positiva: um distanciamento cada vez maior entre nós, lutas de poderes constantes, faltas de respeito e dificuldade em impor limites, regras e rotinas. Quanto mais eu gritava ou ameaçava com castigos, por exemplo, mais eles me desafiavam. Andávamos num permanente braço de ferro.
Muitos pais revelam sentir alguns problemas em situações nas quais têm de impor autoridade. Os filhos reagem mal, intensificam o choro, as birras, revelando, muitas vezes, sensação de medo. No livro, fala de um conceito de firmeza com carinho. Como podemos mostrar carinho e amizade aos filhos, sem que eles percam a noção de que devem respeitar os pais?
O conceito que junta firmeza e carinho é a base da Disciplina Positiva. E pretende romper precisamente com os conceitos de extremos – o autoritarismo e a permissividade – permitindo aos pais e aos educadores encontrarem um equilíbrio. Se é fácil? Não. Porque quando mudamos as respostas que damos às crianças, quando passamos a agir de outro modo, elas vão testar. E por vezes ainda com mais força, para perceberem se estamos a ser coerentes ou se vamos voltar à fórmula anterior.
Firmeza pressupõe três coisas essenciais: regras, limites e rotinas, de que todas as crianças precisam. Mas eu só consigo estabelecer essas três coisas de uma forma efetiva se as equilibrar com algo essencial: o carinho. Que pressupõe duas coisas: o amor incondicional (conseguirmos fazer passar a mensagem de que amamos os nossos filhos independentemente dos seus comportamentos) e o respeito pela criança. Ao gritar, ameaçar ou bater, por exemplo, não estou a respeitá-la. Como nos sentiríamos se o nosso superior hierárquico agisse assim connosco no nosso local de trabalho? Teríamos vontade de melhorar, de colaborar, de sermos melhores? Firmeza e carinho são como inspirar e expirar na respiração: não devem viver um sem o outro.
Convencer as crianças a lavarem os dentes ou a prepararem a mochila diariamente é, por vezes, um bicho de sete cabeças para os pais. O Nuno sugere que, nalguns casos, a definição de rotinas falha porque as crianças não são envolvidas na organização e fala de um conceito muito interessante – as opções limitadas. Como é que esta nova abordagem mudou o ambiente lá em casa?
Mudou radicalmente. Mas, mais uma vez sublinho, não foi de um dia para o outro. Foi preciso treino, coerência, persistência e paciência. Ao envolvermos as crianças nas soluções, elas sentem-se valorizadas, que têm voz, e mais facilmente colaboram. O estímulo é uma “ferramenta” extremamente poderosa! Ao dar opções limitadas – por exemplo: “preferes este ou aquele iogurte” ou “qual destes vestidos queres levar para a escola” – estou a criar essa envolvência sem me fragilizar sem educador (pois as opções que dou terão de ser razoáveis para mim) e a trabalhar as tais competências fundamentais: autonomia, responsabilidade, cooperação e autoestima.
Falemos agora das birras de supermercado. Muitos pais evitam levar os filhos às compras para não terem que passar por situações embaraçosas. Há alguma dica para os pais que sofrem com este problema?
Também passei por isso com os meus filhos e a minha maior preocupação, como a de muitos pais e mães, é aquilo que os outros poderão pensar. Na maior parte das vezes pessoas que estão à volta e que nem conhecemos. Hoje criei uma espécie de redoma mental e só estamos ali eu e a birra para resolver, não vejo ou ouço nada à minha volta.
Depois não perco grande tempo com sermões, sendo firme (assertivo) mas carinhoso (respeitando a criança) ao mesmo tempo, tento perceber a razão da birra e tirá-la rapidamente do local para resolver sem espectadores. Uso muito a mudança de foco, a distração, uma brincadeira ou palhaçada, embora nem sempre resulte. Depois, quando a criança já se acalmou, há sempre lugar a uma conversa sobre o que se passou, por forma a refletirmos em conjunto sobre o que sentimos e pensámos e o que poderemos fazer de diferente para que tal não volte a repetir-se.
O Nuno refere no livro que os pais e professores tentam muitas vezes interromper o choro e as birras com outros estímulos, para evitar que os ambos sofram. Serão os smartphones e os tablets um bloqueio para a experiência das emoções?
As tecnologias são já um dos maiores desafios dos pais modernos. É incontornável e pode ser muito útil em diversas situações, mas também muito nociva noutras. É mais fácil, quando estamos cansados ou sem paciência, darmos um smartphone ou um tablet à criança. Até porque sabemos que, em princípio, tal vai ser suficiente para ela se acalmar e para termos uns minutos de descanso.
Não sou fundamentalista e não me choca que o façamos pontualmente. Mas quando o fazemos por sistema, estamos a desresponsabilizar-nos, a evitar enfrentar a realidade, a desaproveitar momentos que poderiam ser únicos para conversarmos, ensinarmos as crianças a aprenderem com os erros, a refletirem sobre os comportamentos. Fugir às emoções não me parece, de todo, uma boa solução. Quando o fazemos, isso tem um impacto profundo nas relações e pagamos a fatura mais tarde, sobretudo na adolescência deles, quando o canal de comunicação tem tendência a fechar-se.
O livro “Educar pela Positiva: um guia para pais e educadores” encontra-se disponível nas livrarias e poderá ser um belo presente de Natal para qualquer educador. Fica a dica!
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Adorei o livro, estou à espera do volume II?