Muitas famílias já contam com, pelo menos, três semanas de quarentena. Se, até aqui, já todos os pais sentiram na pele as dificuldades de terem os filhos em casa, todos os dias, será a partir de agora que poderão começar a surgir problemas mais sérios.
Por isso, decidimos conversar com Raquel Costa, Terapeuta Ocupacional e uma das responsáveis do “Crescer com Sentidos”, um projeto pioneiro que engloba os serviços de Terapia da Fala e Terapia Ocupacional. Raquel tem continuado a acompanhar muitas famílias, através da “Teleterapia”.
Pelos desabafos dos pais e pelas reações que vai recebendo às partilhas de atividades que tem feito nas suas redes sociais, reconhece que a adaptação a esta nova rotina tem sido um desafio para os pais. A definição de rotinas e as perceção das reais necessidades da criança são, para a terapeuta, dois pilares fundamentais para ultrapassar esta quarentena da melhor maneira. Afirma que a Terapia Ocupacional pode ser benéfica não só para as crianças, como para o bem-estar dos pais e dos avós!
1 – Há uma palavra que talvez resuma aquilo que muitos pais têm sentido durante esta quarentena: o desafio. É desafiante estar 24 horas, sucessivamente, com os filhos, encontrar formas de os entreter, de os instruir, sem que sintam em demasia o sufoco que é ter que estar permanentemente em casa. Pelos relatos que tem ouvido, quais têm sido os principais desafios?
Exatamente, e para além do desafio a palavra de ordem deste momento é a “adaptação”! Adaptação às novas rotinas, contextos e ambientes.
Relativamente aos pais, neste momento, e dado que já passaram cerca de 3 semanas desde o início da quarentena, nota-se uma dificuldade acrescida para manterem as crianças em casa a realizarem atividades produtivas. A esta dificuldade acresce ainda as mudanças comportamentais da criança, que se vão intensificando com o passar dos dias, cada vez mais têm a necessidade de experimentar novos estímulos, novas atividades, e sobretudos novos ambientes.
2 – Neste momento, em que muitos já contam com cerca de três semanas em quarentena, o cansaço e o desânimo começam a tomar conta da energia dos pais. Que principais conselhos tem para quem já começa a esmorecer?
Sim, é verdade que as energias dos pais se vão esgotando ao contrário da das crianças. Um dos principais pontos a serem seguidos nesta quarentena é o estabelecimento de rotinas diárias a serem cumpridas por toda a família, em que existem horas para acordar, vestir, brincar, cumprir as obrigações escolares e laborais por parte dos pais, e as obrigações domésticas também onde as crianças também deverão ser incluídas. Promover momentos de trabalho, mas também é igualmente importante estabelecer momentos de lazer e de descontração para ambas as partes.

3 – Em virtude da vida enérgica e dos estímulos que têm à sua volta, muitas crianças apresentam alguns sinais de hiperatividade, desatenção, inquietude e irritação. O confinamento em casa pode ajudar a agravar estas características?
Sim, o confinamento pode criar uma maior intensificação desses comportamentos. Com esta mudança anormal das rotinas de escola, trabalho, atividades extra-curriculares e de lazer, que permitem diariamente, e em grande parte dos casos, a regulação da criança, a ausência destas mesmas atividades da vida diária e das suas ocupações vão destabilizar este processo. Contudo, existem variadíssimas formas de ultrapassar estes obstáculos.
4 – Como é que os pais podem contribuir para a contrariar estas tendências?
Então, primeiro, os pais precisam de perceber o que está a causar esta desregulação de comportamentos, quais são as necessidades da criança no momento, quais os estímulos que estão em falta e que aparentemente agora não lhe são acessíveis, e que antes ela adquiria no seu dia-a-dia para compensar estes comportamentos.
Em segundo lugar gostaria de realçar a importância da continuidade do apoio por parte das intervenções terapêuticas em casos de crianças que já frequentavam algum tipo de terapia. É de grande importância os pais manterem contacto com os técnicos especializados que acompanham a criança para juntos analisarem as necessidades da criança e da família no momento que estão a viver. Porque todas estas mudanças exigem também uma reavaliação do plano de intervenção, das estratégias a utilizar e um acompanhamento mesmo que à distância é sempre possível ser realizado, seja através da telemedicina, da passagem de estratégias aos pais e cuidadores, ou a passagem de um plano de atividades criado pelos técnicos que sejam adequadas à criança e às necessidades dos pais.

5 – De que forma é que os pais devem organizar o dia-a-dia das crianças, para continuarem a fornece-lhes os estímulos certos?
Como já referi anteriormente, estabelecer rotinas é um ponto essencial. Esta criação das rotinas deve ser realizada em conjunto, entre pais e crianças, e todos os intervenientes que possam estar incluídos no seu ambiente. Apresentar quais os deveres de cada elemento da família, mas também devemos salvaguardar umas horas durante o dia para atividades estruturadas e também atividades livres. É muito importante que os pais participem com as crianças nestes momentos de exploração, para assim também promoverem os laços e a empatia familiar.
Depois desta criação de rotinas, vem a escolha das atividades de exploração e estimulação a serem realizadas. A meu ver, devemos proporcionar à criança atividades que estimulem todos os sentidos. A partir daí, e caso seja algo novo para os pais, irão começar a entender quais os estímulos que regulam melhor a criança, pois isso é variável de criança para criança. Enquanto para umas podem ser atividades mais dinâmicas com muito movimento, como uma corrida de obstáculos, noutras podem ser atividades que envolvam mais a exploração sensorial tátil, com é o caso das atividades de reconhecimento de diferentes texturas.
6 – As atividades de terapia ocupacional podem ser úteis também para os pais? E, já agora, para os avós?
Sem dúvida que sim, quando estamos a intervir com uma criança estamos também a intervir, mesmo que seja de forma indireta, em todos os ambientes e contextos em que a criança participa, seja em casa com a família, na escola ou na comunidade.
Podemos pensar desta forma, o nível de regulação da criança tem impacto direto nas rotinas e organização de toda a família. Quando uma criança está desregulada, por vezes, é difícil para a família saber lidar com a situação e encontrar os melhores estímulos para a regular o que influencia toda a dinâmica familiar, assim como o estado emocional. Se a criança estiver regulada, o dia-a-dia da família será muito mais fácil de gerir a todos os níveis.
Existem muitas atividades que podem ser feitas em família, mesmo que seja há distância, por terem por base objetos do uso quotidiano. É isso que tenho tentando fazer na página de Facebook e Instagram “Crescer com Sentidos”, onde diariamente são apresentadas dicas de atividades que podem ser realizadas em casa e com material que está quase sempre acessível a toda a comunidade.

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